Mensagens, anotações e documentos extraídos pela Polícia Federal (PF) do celular do coronel da reserva do Exército Flávio Peregrino, assessor do general Walter Braga Netto, revelam bastidores inéditos das articulações golpistas após a derrota de Jair Bolsonaro nas eleições de 2022. O material, obtido com exclusividade pelo Estadão, também expõe o incômodo de militares com a estratégia de defesa do ex-presidente, que tenta transferir a eles a responsabilidade pelos planos de ruptura institucional.
Em suas anotações, Peregrino aponta que o próprio Bolsonaro liderou as articulações e que os militares atuaram para apoiá-lo, pois “sempre foi a intenção dele” de permanecer no poder mesmo após perder de forma democrática à Presidência da República. As declarações fortalecem as acusações contra o ex-presidente, que serão examinadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
As defesas de Braga Netto e de Bolsonaro não se manisfestaram. Já Luís Henrique Prata, defensor de Peregrino, disse que as anotações foram “formuladas com base na liberdade de expressão e no contexto da assessoria de um dos envolvidos” e ressaltou “a lealdade dos militares na busca de soluções constitucionais naquele período e ao longo de todo governo”.
Peregrino é investigado por supostamente tentar acessar informações sigilosas da delação do tenente-coronel Mauro Cid, mas não foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República nos processos sobre o plano de golpe. O material analisado foi apreendido em dezembro de 2024, na mesma operação da PF que prendeu Braga Netto.
Através de mensagens enviadas a si mesmo, o coronel contesta a tese da defesa de Bolsonaro de que os militares teriam articulado um golpe sem o seu conhecimento. Em um texto intitulado “Ideias gerais da defesa”, datado de 28 de novembro de 2024, Peregrino critica diretamente a narrativa do ex-presidente:
“Oportunismo e o que mostra que tudo será feito para livrar a cabeça do B [Bolsonaro]. Estão colocando o projeto político dele acima das amizades e da lealdade que um Gen H [Heleno] sempre demonstrou ao B [Bolsonaro]”, escreveu.
Também há o registro de Peregrino criticando a falta de gratidão de Bolsonaro.
“Deixar colocarem a culpa nos militares que circundavam o poder no Planalto é uma falta total de gratidão do B [Bolsonaro] àqueles poucos, civis e militares, que não traíram ou abandonaram o Pres. B [Bolsonaro] após os resultados do 2º turno das eleições.”
O coronel reconhece erros dos próprios militares, como não desmontar acampamentos em frente a quartéis e não convencer Bolsonaro a desistir do golpe. Mais tarde, classificou as ações da defesa de Bolsonaro como “desorientação” e “falta de coerência” e acusou o ex-presidente de estar “forçando” uma ordem de prisão para sustentar a narrativa de perseguição pelo STF.