Nesta semana, o The New York Times publicou um estudo elaborado pelo Real Madrid sobre a possibilidade do clube, pela primeira vez em sua história, abrir seu capital e permitir a entrada de investidores por meio da emissão de cotas. Fundado em 1902 e tradicionalmente estruturado sob o modelo associativo, o clube cogita realizar um IPO (oferta pública inicial de ações).
Apesar de figurar entre as instituições esportivas mais poderosas e rentáveis do mundo, o Real Madrid não ignora a crescente presença de grandes grupos de investimento no futebol europeu. Casos como os do Manchester City, Paris Saint-Germain e Liverpool reacendem o debate sobre a competitividade dos clubes associativos diante dos vultosos aportes financeiros realizados por conglomerados internacionais.
O The New York Times menciona, inclusive, a possibilidade de o Real Madrid adotar o modelo “50+1”, utilizado na liga alemã (Bundesliga). Esse sistema assegura que, no mínimo, 51% das cotas permaneçam sob controle da entidade associativa, impedindo que investidores externos exerçam poder decisório em matérias esportivas. Caso o projeto avance, é provável que o clube opte por instrumentos como ações preferenciais sem direito a voto, títulos participativos ou fundos de investimento desportivo, mecanismos que viabilizam a captação de recursos sem a perda de controle sobre as decisões estratégicas.
Do ponto de vista jurídico e regulatório, a abertura de capital exigiria do Real Madrid uma série de transformações. O clube teria que promover uma reforma estatutária, cuja aprovação pelos associados é condição indispensável; e eventualmente converter parte de sua estrutura jurídica de associação para Sociedad Anónima Deportiva (SAD).
Além disso, a legislação espanhola impõe o registro junto à Comisión Nacional del Mercado de Valores (CNMV), o clube deverá também cumprir todas as normas do mercado financeiro aplicáveis às companhias listadas na bolsa de valores espanhola.
Embora a FIFA não regulamente diretamente a abertura de capital de clubes, suas normas sobre Fair Play financeiro e governança exigem transparência contábil e compliance financeiro, por meio do sistema parecido com o Clearing House, tais princípios também são reforçados pela UEFA, Nesse sentido, a UEFA, por sua vez, dispõe de regulamentação específica acerca da emissão de ações, abertura de capital e divulgação de instrumentos financeiros.
No documento UEFA Club Licensing and Financial Sustainability Regulations (2022), determina-se que os clubes devem divulgar informações detalhadas sobre o capital social emitido no período (share capital issued during the reporting period), incluindo número e tipo de ações, montante levantado e justificativa para a emissão de novos títulos.
Em termos práticos, caso o Real Madrid avance para uma “Equity Participation by External Investors”, deverá:
1. Comunicar à UEFA e à LaLiga toda alteração de controle societário ou emissão de capital (arts. 47–51 e Anexo F);
2. Comprovar sustentabilidade financeira (arts. 66–67);
3. Garantir que o novo investidor não viole a regra de propriedade múltipla (art. 5);
4. Manter sua estrutura jurídica em conformidade com a legislação espanhola e os princípios de integridade e transparência exigidos pela UEFA. Caso o movimento se concretize, representará um marco não apenas para o Real Madrid, mas para o futebol mundial. A abertura de capital, se conduzida com rigor técnico e transparência, pode inaugurar uma nova era de governança, sustentabilidade e profissionalização no esporte. O Real Madrid, que sempre esteve à frente de seu tempo dentro de campo, poderá agora elevar ainda mais o seu nível de competitividade, impactando e beneficiando o futebol global.






