Por Ana Paula Belinger
Advogada e sócia-fundadora da Belinger Inc.
O ambiente tributário brasileiro voltou a se movimentar. No dia 2 de outubro de 2025, o Comitê Gestor do Simples Nacional publicou a Resolução CGSN nº 183/2025, um ajuste normativo que pode parecer discreto à primeira vista, mas carrega impactos profundos para microempresas, empresas de pequeno porte e para o microempreendedor individual. É uma peça que se encaixa no grande quebra-cabeça da Reforma Tributária — e que exige atenção redobrada do empreendedor brasileiro.
A norma altera pilares estruturais da Resolução nº 140/2018, ampliando conceitos, consolidando receitas e apertando mecanismos de fiscalização. Na prática, o Simples Nacional — aquele regime desenhado para simplificar — ganha fronteiras mais rígidas e passa a exigir uma gestão financeira mais alinhada com a realidade econômica de cada negócio.
O que muda no conceito de receita bruta
A primeira grande mudança é conceitual. Receita bruta, que antes já era fonte de dúvidas, foi redesenhada para abranger tudo que estiver ligado à atividade empresarial: receitas principais, acessórias, eventuais ingressos e demais valores que, embora não fossem tradicionalmente classificados como faturamento, refletem a operação econômica da empresa.
Essa ampliação pode levar ao desenquadramento de empreendedores que operavam próximos ao limite anual. E embora a norma seja mais abrangente, vale lembrar que o Superior Tribunal de Justiça mantém uma distinção importante: valores que não representam receita própria, como gorjetas, por exemplo, não devem compor a base de cálculo do Simples, conforme decisões recentes do tribunal.
Quando o faturamento de uma empresa vira o de todas
Outro ponto sensível é a consolidação de faturamento entre empresas que compartilham sócios, estruturas ou operações interdependentes. A regra mira grupos empresariais que pulverizam atividades em diferentes CNPJs. Agora, se houver ligações societárias relevantes, a Receita poderá somar os faturamentos para medir o limite do regime.
É uma mudança que exige reavaliação estratégica: estruturas societárias antes eficientes podem se tornar um passivo tributário imediato.
MEI: o CPF entra na conta
O Microempreendedor Individual também sentirá o impacto. Pela nova regra, receitas recebidas no CPF, sejam de trabalhos autônomos, consultorias ou qualquer prestação de serviço, passam a ser somadas ao faturamento do CNPJ para fins de enquadramento. Isso torna mais fácil ultrapassar o limite anual de R$ 81 mil.
Em outras palavras, a fronteira entre pessoa física e jurídica ficou mais estreita para o MEI. E isso exige um controle financeiro muito mais rigoroso.
E agora? Como as empresas devem se preparar
As novas regras do Simples Nacional representam mais do que ajustes burocráticos. Elas redefinem o modelo de conformidade esperado pelo fisco e cobram maior consistência na gestão financeira.
Alguns movimentos são essenciais:
•Revisar o planejamento tributário à luz do novo conceito de receita e das regras de consolidação entre empresas com sócios comuns.
•Refinar os controles internos, separando com precisão receitas de CPF e CNPJ.
•Reavaliar estruturas societárias, especialmente quando há interdependência operacional entre diferentes CNPJs.
•Acompanhar o cenário legislativo, já que há articulação no Congresso para sustar a norma, especialmente a parte que afeta o MEI.
Possível revogação à vista
Embora a resolução esteja em vigor, sua permanência não é certa. Deputados já discutem sua revogação por meio de proposição legislativa, especialmente diante do impacto sobre microempreendedores que podem perder o enquadramento por causa da soma das receitas do CPF.
Se a medida for sustada, ajustes feitos agora poderão precisar ser revistos. Mas, enquanto a revogação não se confirma, a regra vale — e deve ser observada.
Conclusão: mais estratégia, menos improviso
A Resolução CGSN nº 183/2025 inaugura uma nova etapa do Simples Nacional: mais integrada, mais fiscalizada e menos tolerante a improvisos. A definição de receita se amplia, o cruzamento entre CNPJ e CPF se intensifica e a lógica empresarial passa a exigir maior transparência.
Para muitos empreendedores, isso pode parecer um desafio. Mas também é uma oportunidade para fortalecer processos internos, corrigir distorções e adotar um modelo de gestão mais sólido e sustentável.
A Belinger Inc. acompanha de perto as mudanças e está preparada para orientar nossos clientes nessa transição — sempre com a visão preventiva que nos guia: evitar riscos hoje para garantir segurança e crescimento amanhã






