O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu, nesta quinta-feira (18), a existência de racismo estrutural no Brasil e determinou a adoção de medidas para enfrentar violações de direitos da população negra. O julgamento analisou se há omissão do Estado brasileiro nesse combate e resultou na imposição de novas obrigações ao Poder Executivo.
A decisão foi tomada no julgamento da ADPF 973, encerrado com os votos dos ministros Gilmar Mendes e do presidente da Corte, Edson Fachin. A ação foi proposta por partidos políticos que apontaram violações sistemáticas de direitos fundamentais da população negra em áreas como vida, saúde, segurança pública e alimentação.
O relator, ministro Luiz Fux, inicialmente defendeu o reconhecimento do chamado “estado de coisas inconstitucional”, caracterizado por violações massivas e persistentes de direitos. No entanto, ao final do julgamento, reajustou seu voto, entendendo que, apesar da gravidade do quadro, a existência de políticas públicas já adotadas ou em curso impede o reconhecimento formal desse estado jurídico.
Essa posição foi acompanhada pelos ministros Cristiano Zanin, André Mendonça, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Para esse grupo, embora haja violações graves, elas não configuram, juridicamente, o estado de coisas inconstitucional.
Por outro lado, os ministros Flávio Dino, Edson Fachin e Cármen Lúcia votaram pelo reconhecimento da omissão estatal sistêmica. Em seu voto, Fachin afirmou que o racismo estrutural no Brasil atende aos quatro critérios exigidos para esse reconhecimento: violação generalizada de direitos, persistência histórica, insuficiência de soluções individuais e necessidade de atuação coordenada de diversos órgãos do Estado.
Segundo o presidente do STF, essas violações são contínuas e têm raízes no período escravocrata, agravadas pelo chamado mito da democracia racial, que teria invisibilizado o racismo e dificultado a adoção de políticas reparatórias. Para Fachin, essa escolha histórica contribuiu para a manutenção de profundas desigualdades sociais e econômicas.
Apesar da divergência sobre o enquadramento jurídico, a Corte determinou uma série de medidas práticas. Entre elas, está a obrigação de o Poder Executivo revisar o Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial (Planapir) ou elaborar um novo plano, com metas e prazos definidos, no prazo máximo de 12 meses.
O plano deverá abranger áreas como saúde, segurança alimentar, segurança pública, proteção da vida, além de políticas de caráter reparatório e de preservação da memória da população negra. O cumprimento das medidas será acompanhado e fiscalizado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
Durante o julgamento, Fux destacou que políticas como o sistema de cotas raciais são relevantes, mas insuficientes para enfrentar a dimensão estrutural do problema. Segundo ele, é necessário atacar as origens das desigualdades, presentes em áreas como educação, saneamento, moradia, segurança e oportunidades de ascensão social.
A decisão também estabelece diretrizes para setores específicos. Na educação, prevê a capacitação de professores para o ensino da história e da cultura afro-brasileira. No sistema de Justiça, aponta a necessidade de protocolos de atendimento voltados à população negra em tribunais, Ministérios Públicos, Defensorias e forças de segurança.
A ADPF 973 foi julgada no contexto da programação especial do STF para a Semana da Consciência Negra, iniciada em 26 de novembro, e reforça o reconhecimento institucional de que o racismo estrutural segue sendo um dos principais desafios do Estado brasileiro.






